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Brasil

Alexandre Garcia: Do Oiapoque ao Chuí

Alexandre Garcia: Do Oiapoque ao Chuí

Democracia é a voz do povo. Só quem não é democrata discorda dessa verdade. O corolário dessa verdade é que se não houver a voz do povo, livre, não há democracia. A censura que restringe a liberdade de expressão e opinião é vedada na Constituição do Brasil. Como se expressa a voz do povo? Pela fala em lugares públicos. E, graças aos avanços digitais, pelas redes sociais, que ampliam, turbinam, potencializam a voz de cada pessoa, que ganha alcance universal. Há uma diferença, não há como não reconhecer, entre a voz nas redes e a voz na mídia tradicional. A mídia tradicional escolhe o que o povo pode receber como informação, ou o que é preciso informar ao povo. Nas redes, o povo é quem escolhe o que receber e o que descartar; é o exercício do discernimento de cada um, que também pode participar com sua voz. Volta e meia ministros do Supremo pregam “regulamentação das redes sociais”, além do que já está na lei, o Marco Civil da Internet, em vigor há 11 anos. Censura em nome da democracia. 

Comemorou-se “40 anos de democracia”. No primeiro dia desse período, já passaram por cima da Constituição, quando um general que se disse dono do episódio foi decisivo para que não assumisse o presidente da Câmara, tal como está nos art. 78 e 79 da Constituição de 1967, então vigente. O general Leônidas Pires Gonçalves, indicado para ministro do Exército, afirmou que não daria posse a quem comparara Geisel a Idi Amin Dada, o ditador de Uganda. Referia-se ao presidente da Câmara, Ulysses Guimarães, que deveria assumir na vacância do presidente e convocar eleições em 30 dias. O eleito, Tancredo Neves, estava hospitalizado e Sarney era vice e substituto de alguém que ainda não era presidente. Sarney assumiu e assim começou. No seu Plano Cruzado, eram presos arbitrariamente gerentes de supermercado e de farmácia, e a polícia entrava nos pastos para prender boi gordo. E se fez uma nova Constituição, a cidadã. No dia da promulgação, Sarney me disse, em entrevista: “Com essa Constituição, o Brasil fica ingovernável”.

Veio Collor e congelou poupanças e depósitos acima de 50 mil cruzados novos (cerca de 7.200 reais). Um atentado à democracia, aprovado depois no Congresso. Em dois anos, recebeu impeachment no Senado, mesmo tendo renunciado horas antes; ainda assim, ficou inelegível por oito anos, como manda a Constituição. No impeachment de Dilma, o que está no art. 52 não valeu, e ela não ficou inelegível, mas foi reprovada pelos mineiros em sua candidatura ao Senado. Ficou em quarto lugar. Sabotaram a Constituição no Senado, em julgamento conduzido pelo guardião dela, o Presidente do Supremo, e o povo precisou corrigir nas urnas. Nos governos petistas, o mensalão e a lava-jato mostraram que a democracia fica disforme quando o dinheiro de estatais e dos impostos do povo é desviado para políticos e seus partidos. Tudo isso nesses democráticos 40 anos.

Nos últimos seis anos desses “40 de democracia”, vigorou o “Inquérito do Fim do Mundo”, passando por cima da iniciativa do Ministério Público, do devido processo legal, da ampla defesa, do juiz natural, da vedação à censura e ao juízo de exceção. O queixoso investiga, denuncia, julga e manda executar. Pessoas e instituições e partidos que concordam com isso, expõem um silêncio hipócrita, pois continuam falando em democracia e condenando “atos antidemocráticos”. Desobedecer à Constituição que se jurou cumprir é crime mais grave que um quebra-quebra. Com os desdobramentos do inquérito de exceção na política e no cotidiano, o país passou a sofrer a derrogação dos direitos e garantias fundamentais e da inviolabilidade dos representantes do povo por suas palavras e opiniões. Parafraseando Churchill, uma cortina cor de toga baixou sobre o Brasil, do Oiapoque ao Chuí.

Fonte: www.correiobraziliense.com.br

Publicado em: 2025-03-19 03:58:00 | Autor: |

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