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É verão: você é suficientemente negro pra sambar e usar tranças?

É verão: você é suficientemente negro pra sambar e usar tranças?

Zap – 71 993861490 Vou logo dizendo que, hoje, nem concordo nem discordo. Nesses dias, não pretendo dar opinião. Só tô trabalhando porque não nasci rica, na verdade queria estar de boréstia, alternando entre a rede e o mar da ilha. Sendo assim, apenas faço perguntas porque, sinceramente, não tô entendendo algumas coisas muito direitinho não. Por exemplo, quem tá na Bahia sabe que rola um processo seletivo pra ver quem pode trançar os cabelos. Não sei exatamente quais são os critérios para aprovação nem quem está na comissão julgadora, mas tem um bocado de gente reclamando que teve o projeto capilar reprovado neste verão. Veja que não advogo em causa própria. Eu mesma não suporto trança (minha cabeça, minhas regras, se saia), mas tem uma galera que gosta. Porém, agora, dizem que a pessoa que se candidata a fazer tais penteados tem que ver se é suficientemente negra, ou seja, se tem melanina e curvatura capilar “compatíveis”. Se não tiver, que nem trance porque é “apropriação cultural”. O fato é esse. Vamos à elaboração. Fico pensando aqui no seguinte: se a trancista – que, em geral, é mulher negra – por exemplo, for suficientemente negra e trançar o cabelo de uma pessoa insuficiente mente negra, o dinheiro não tá indo pra a mulher suficientemente negra que trançou? Então não seria ela mesma se apropriando da própria cultura ancestral, trabalhando com isso e ganhando dinheiro pra sustentar as crianças? Isso, por um lado que acho bom se pensar. Por outro, a bem da honestidade histórica, Rapunzel – aquela personagem que, conforme todos sabemos, jogava as imensas tranças pela janela do castelo pro tal príncipe subir – não era Alemã? A Alemanha fica em que parte da África, binho? E os vikings, com os cabelos trançadíssimos, vieram da Costa do Marfim ou de Angola? E os chineses, com aqueles ancestrais de tranças longuíssimas, estão chegando aí (inclusive pra fazer a ponte da ilha que só deus sabe quando vai sair) de Moçambique ou de Gana? Aí vem a outra dizendo que “precisamos discutir a presença do branco no samba” e eu fico matutando igualmente, sem chegar à conclusão. Tá certo, então. Porém quais são os brancos que vamos discutir? Zeca Pagodinho, João Bosco e Chico Buarque? Clara Nunes e Beth Carvalho? Os brancos que vão sambar? É pra tirar todo mundo? Mas aí deixa ou tira o cavaquinho, que é um instrumento de origem portuguesa e tá em tudo que é roda de samba? Essa, talvez, seja uma questão. Solução eu não tenho, se vire aí. Mas meu namorado mesmo tava dizendo outro dia que no II Encontro Internacional de Investigadores em Estudos Afrolatinoamericanos que ele foi lá em Cartagena, ficou sabendo de uma pesquisa, feita por um portoriquenho, que chega à seguinte conclusão: hoje é mais sensato observar as ramas do que as raízes. Fiquei pensativa, fique também que pensar é bom. Leia de novo, raciocine e veja se ele tem razão. Porém não sei, mas completo: principalmente na Bahia, no verão. Agora tchau que vou ali lavar as lambretas pra cozinhar com azeite turco e comer com Campari. Talvez proibida e nem sei de, inevitavelmente baiana (e miscigenada e vira-lata pra caramba), misturar Ilha de Itaparica com “eurásia” e Milão.

Fonte: www.correio24horas.com.br

Publicado em: 2023-04-11 15:09:00 | Autor: Flavia Azevedo |

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