O Congresso Nacional aprovou nesta quarta-feira (19) um projeto, articulado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que destrava cerca de R$ 4,6 bilhões em emendas parlamentares das quais ele próprio é o principal beneficiado.
A tramitação toda do texto durou menos de dois meses e aconteceu de forma acelerada, com amplo apoio da base do governo Lula (PT).
A votação desta quarta aconteceu fora da previsão da pauta do dia, sem que o texto constasse no sistema do Senado e de forma acelerada. Agora ele vai à sanção da Presidência da República.
A proposta é uma das atuais investidas do Congresso para manter as emendas parlamentares, que são contestadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) por falta de transparência e critério para aplicação dos recursos.
Como mostrou a Folha, os parlamentares também aprovaram recentemente um outro texto, que deveria dar mais controle ao rito das emendas, mas na prática cria mecanismos para manter escondido o nome de quem faz a indicação da destinação da verba.
O projeto que revive emendas canceladas foi apresentado em 11 de fevereiro pelo líder do governo no Senado, Randolfe Rodrigues (PT-AP), que é do mesmo estado de Alcolumbre.
Ele foi aprovado no Senado oito dias depois. Quando chegou à Câmara dos Deputados, o líder do governo na Casa, José Guimarães (PT-CE) apresentou um pedido para que ele tramitasse em regime de urgência —indo direto ao plenário, sem passar por comissões.
O requerimento foi acatado, independente da promessa do atual presidente da Câmara, Hugo Mota (Republicanos-PB), de não repetir a gestão de Arthur Lira (PP-AL), quando a tramitação urgente se tornou quase uma regra na Casa.
O texto ficou sob relatoria do deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), coopartidário de Alcolumbre e conterrâneo de Guimarães.
Forte fez algumas alterações no projeto, que foi aprovado na Câmara na última terça-feira (18).
Como sofreu mudanças, ele precisou passar novamente pelo Senado, onde surgiu na sessão plenária já desta quarta, de forma extrapauta —instrumento que permite ao presidente encaminhar textos que não estavam na previsão inicial do dia.
No momento em que foi anunciado, o projeto nem sequer constava no portal público do Senado, segundo consulta feita pela Folha.
Seu relator foi designado oralmente por Eduardo Braga (MDB-AM), que substituía Alcolumbre na condução da sessão naquele momento.
A votação demorou mais que o esperado porque, àquela altura, a presença no plenário era baixa e foi necessário que senadores pedissem aos seus colegas que comparecessem para que houvesse número mínimo para deliberação da matéria.
Após 20 minutos, o projeto foi aprovado. Votaram apenas 69 dos 81 senadores, 66 deles favoráveis à proposta.
O texto devolve ao Orçamento bilhões de restos a pagar que haviam sido cancelados.
Esses valores são investimentos previstos para um determinado ano, mas que acabaram não sendo pagos naquele exercício e, por isso, passam para o seguinte classificados como restos.
Pela lei atual, após dois anos, se essas quantias seguirem empacadas, eles são canceladas e ficam à disposição da União.
O projeto articulado por Alcolumbre, porém, impede o cancelamento dos restos de 2020, 2021 e 2022 e que haviam caído.
Um levantamento da Consultoria da Câmara revelado pelo UOL mostra que deste montante (R$ 4,6 bilhões), o estado de Alcolumbre, o Amapá, é o que mais tem a ganhar: R$ 515 milhões.
Desses, ao menos R$ 130 milhões eram do próprio presidente do Senado.
Dos R$ 4,6 bilhões, o projeto retoma R$ 2,2 bi de emendas de relator —mecanismo amplamente usado pelo ex-presidente da Câmara Arthur Lira e que foi derrubado pelo Supremo em 2022.
Outros R$ 2,4 bilhões são de emendas de comissão —modalidade que vem substituindo a de relator por também permitir manter anônimo o nome que indicou a verba.
É dentro desta modalidade que a resolução aprovada pelo Congresso recentemente cria a figura chamada de “emenda dos líderes”, na qual os parlamentares conseguem se manter escondidos atrás da assinatura das lideranças partidárias.
Publicado em: 2025-03-19 19:46:00 | Autor: João Gabriel |