Não é a primeira vez que o ministro da Previdência, Carlos Lupi, protagoniza um impasse político em decorrência de escândalo de corrupção em pasta sob seu comando. Quando era ministro do Trabalho no governo Dilma Rousseff, também resistiu muito a deixar o cargo, chegando a afirmar que só sairia do ministério “abatido à bala”. Convocado a prestar esclarecimentos na Câmara, em novembro de 2011, na tentativa de permanecer no ministério, Lupi pediu desculpas: “Eu gosto de fazer o debate, às vezes exagero. Peço desculpas públicas. Presidente Dilma, me desculpe, eu te amo”, disse.
Àquela ocasião, durante audiência pública na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC), Lupi negou que seu chefe de gabinete, Marcelo Panella, estivesse envolvido em irregularidades na pasta. Disse que não existe “título mais importante que a lealdade” e saiu em defesa do seu braço direito, que coincidentemente é o seu atual chefe de gabinete no Ministério da Previdência.: “Não tem possibilidade de o Marcelo estar envolvido em irregularidades”, afirmou.
Reportagem da revista Veja revelou que o ministério contratava entidades para dar cursos de capacitação profissional e, depois, assessores exigiam propina de 5% a 15% para resolver ‘pendências’ que eles mesmos criaram. Marcelo Panella era o tesoureiro do PDT, mas hoje está licenciado da Executiva da legenda.
Lupi não está entre os investigados do esquema ilegal no INSS, mas o escândalo ameaça levar o governo Lula à lona. Sindicatos e associações credenciadas pelo Ministério da Previdência descontavam ilegalmente valores das contas de aposentados e pensionistas, sem consentimento, numa escala sem precedentes. A Polícia Federal estima que, entre 2019 e 2025, a fraude movimentou R$ 6,3 bilhões.
Lupi é criticado pela demora ao agir contra o esquema, que já era conhecido pelo ministro desde junho de 2023. Ele levou ao menos dez meses, segundo documentos do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS), para adotar medidas contra as fraudes. Entretanto, o governo está dividido quanto à saída de Lupi.
Nas comemorações do 1º de Maio, o ministro do Trabalho, Luís Marinho, saiu em defesa do seu colega de Esplanada: “O ministro Lupi tem as ferramentas agora, com a nova gestão do INSS, para poder tomar as decisões, fazer as correções de rota e dar a garantia para a sociedade de que o INSS é uma instituição séria”, disse.
Marinho acredita que não há indícios de participação de Lupi até o momento, mas disse que outros fatores são levados em conta para mantê-lo ou não no cargo. “A continuidade de um ministro, muitas vezes, passa por uma avaliação política, não simplesmente se o ministro tem ou não culpa”, completou. É o caso, o maior problema do presidente Lula é a bandeira da ética nas mãos da oposição, sem a qual fica difícil exercer a liderança moral da sociedade.
Homem-bomba
O ministro da Previdência já teve seus poderes esvaziados com a nomeação do novo presidente do INSS, o procurador federal Gilberto Waller Júnior, diretamente pelo presidente Lula. Lupi virou um zumbi na Esplanada, porém, assombra o governo e põe em risco a reeleição de Lula. Aposentados e pensionistas do INSS são a base eleitoral mais resiliente do petista.
Marcello Panela, que está novamente no olho do furacão, pode virar um homem-bomba, porque teria indicado alguns consultores contratados por entidades sindicais envolvidos no escândalo. Para quem conhece minimamente os meandros da burocracia federal, é impossível que o esquema de descontos não autorizados de aposentadorias desse tamanho surgisse por combustão espontânea.
O esquema somente teve viabilidade porque foi operado de dentro para fora da máquina do INSS. Como explicar que uma das 29 associações envolvidas no esquema de fraude chegou afiliar até 1.569 aposentados e pensionistas por hora, considerando 20 dias por mês e oito horas de trabalho diário, segundo relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre o caso? O menor fluxo de inclusões no mesmo período foi de 778 filiações.
Embora o esquema tenha surgido ainda durante o governo Temer e mantido durante a gestão de Bolsonaro, a escala das fraudes aumentou exponencialmente durante a gestão de Lupi: dos R$ 6, 3 bilhões recebidos por 11 entidades citadas pela PF até agora, R$ 1,64 bilhão foram descontados em 2023; R$ 3,39 bilhões, em 2024 (alta de 106,1%); e R$ 906,19 milhões, apenas no primeiro trimestre deste ano. Se Lula mantiver Lupi no cargo, seu desgaste será irreversível.
Para formalizar os Acordos de Cooperação Técnica (ACT) com o INSS e realizar os descontos mensais na folha de pagamento de aposentados e pensionistas, as associações necessitavam de autorização expressa dos beneficiários, mas isso não ocorreu. Mesmo assim, os descontos foram feitos. Cerca de 70% das 29 entidades analisadas não tinham entregado ao INSS a documentação completa para fazer os descontos nos benefícios. Tanto o INSS como a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev), durante a auditoria da CGU, em junho de 2024, admitiram que não têm condições técnicas de fiscalizar os descontos. Um esquema desse é operado de dentro para fora da administração.
Luiz Carlos Azedo
Repórter especial
Jornalista, trabalhou nos jornais O Dia, Última Hora, O Fluminense, Diário de Notícias, O Globo e Diário Popular. Dirigiu o semanário Voz da Unidade. Apresentou o programa 3 a 1 da TV Brasil e foi diretor da Companhia de Notícias
Fonte: www.correiobraziliense.com.br
Publicado em: 2025-05-02 05:30:00 | Autor: |